Com um projeto gráfico caprichado e edição bilíngue, Melodias migratórias reúne poemas selecionados de duas décadas de produção da irlandesa Moya Cannon.
O título brasileiro faz referência aos dois contextos que se configuram a matriz de seus versos: o ambiente selvagem e a aliança entre texto e música.
Moya focaliza a existência humana num território primitivo, exaltando as conexões morfológicas com a natureza, de modo a estabelecer um plano representativo protagonizado por animais, plantas e paisagens. O uso desses elementos opera ainda no simbolismo de estados de espírito e circuitos de sensações.
É o que ocorre, por exemplo, em “Depois do funeral”, poema sobre um pai que leva os filhos para acampar, logo após o enterro da esposa. (…) que além do limite da respeitabilidade,/onde razão e civilidade mostram seu segundo rosto,/é difícil enterrar fantasmas.
A coexistência entre consciência e animália institui um espaço de reflexão e encantamento, uma noção muito particular de lar, com a qual a autora dialoga com suas raízes, os mitos e a identidade do povo irlandês.
No afã desse exercício arqueológico, a poesia se engradece ao buscar contato com outras expressões artísticas e com a própria literatura, organizando as palavras com um esmero fonético de forma a descobrir uma sonoridade auto indutiva, preservada no belo trabalho de tradução da escritora curitibana Luci Collin.
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Livro: Melodias migratórias
Editora: Encrenca
Avaliação: Bom